sábado, 23 de maio de 2020

Pandemia

   Ontem encontrei uma das minhas melhores amigas, senão a melhor. Nós nos vimos porque eu precisava entregar uma coisa pra ela. Não pudemos nos abraçar, o que foi péssimo, porque habitualmente vivemos agarradas, grudadas. Ela levou dois pares de luvas, um pra mim e um pra ela. Colocamos as luvas e apertamos as mãos uma da outra, esmagamos as mãos sabendo que aquele seria o máximo de contato que poderíamos ter. Ela com os olhos marejados e eu também, ali de mãos dadas com luvas no ponto de ônibus. Sentamos, com um banco de diferença entre nós, de máscara e luvas e ficamos conversando. Tentando contar sobre coisas que não estariam acumuladas se não estivéssemos por tanto tempo uma longe da outra. Foi horrível!

   Tenho assistido muitos videos engraçados no Instagram e no Tiktok e meu riso tá diferente. Uma gargalhada histérica, acima do tom, exagerada. Nem sei se, em outras condições, acharia tanta graça de tantas coisas. Tô me alimentando de comédia pra não morrer de tédio e pavor, mas admito que hoje fiquei pensando se estou rindo mesmo, achando graça, ou fingindo pra eu mesma que tá tudo bem, tá tudo de boa, o mundo continua girando.

   A música tem me salvado também. Tenho curtido bastante coisa diferente das que eu estava acostumada. Rap agora tá bombando na minha playlist. MPB então, nem se fala!! Música de qualidade de uma galera que eu não conhecia ou conhecia muito pouco. Desligo a TV e fico ali, viajando no som que me traz a sensação de alma em paz. O poder da música, o poder da arte. 

   Já não sei quantos dias faz que estamos em isolamento social, em casa, fugindo de uma doença que tá matando mil por dia no Brasil, Enquanto escrevo esse texto a marca de mortos por essa praga está em 21.116. É gente pra caramba morrendo! Gente pra caramba!! Gente que duvidou do poder da doença, gente que não tomou os devidos cuidados, gente que fez tudo direitinho, mas pegou. Gente gente gente gente. Gente! Todos os dias, eu não estou exagerando, todos os dias recebo mensagem de alguém dizendo que alguém conhecido morreu. E enquanto isso eu tô aqui, tentando.

   Uma saudade absurda de praia, dos meus amigos, de bar, de música ao vivo, de escrever bilhetinho pedindo música, de querer tirar o sapato e sambar descalça, de rir, de abraçar, de chorar ouvindo uma história de sucesso ou de fracasso de alguém, de encontrar ex na rua e fingir que não viu, saudade de reclamar do BRT, de fazer xixi em pé no banheiro do bar, saudade de salto alto, meus amigos. Quem diria que a "mina do tênis" sentiria saudade de usar salto? Saudade de esperar a tarifa do uber baixar pra voltar pra casa, de pedir pro motorista aumentar o som pra eu cantar, saudade de forró e comer carne de sol com manteiga de garrafa. Uma tremenda falta de reclamar da música mal tocada de um show ao vivo de uma banda que é muito melhor no playback.

   Eu não queria que esse texto parecesse muito melancólico, juro. Mas não consigo porque tô só melancolia. Desculpem, leitores, é só o que tenho pra oferecer no momento. Algo diferente disso não seria real, não seria eu. E uma coisa que não sei fazer é fingir, graças a Deus.

   Não faço ideia de quando tudo isso vai terminar. Não tem um prazo pra que a gente possa voltar a viver normalmente, fazendo tudo que sempre fizemos, sem máscara, sem evitar encostar nas pessoas, sem ter que lavar saco de batata palha. Não tem nada legal nisso tudo que está acontecendo, NADA! É uma grande merda você não poder fazer as coisas, ter que lavar compras, andar de máscara e tomar banho de álcool gel. Mas não tem outro jeito e meu pai sempre me disse "o que não tem jeito, ajeitado está". E é isso, vamos nos ajeitando.

   Cuidem-se! Não se culpem pela preguiça, não se exijam, não se forcem, a nada! Façam tiktok, é muito legal e tem uns vídeos bem engraçados. Lavem as compras, usem o álcool gel, não entrem de sapato em casa, lavem suas máscaras, evitem assuntos estressantes, pessoas irritantes, ideias discrepantes. Ascendam um incenso; os de alecrim são uma delícia. Assistam a série "Todas as mulheres do mundo" no Globo Play. Dá um quentinho no coração que vocês também precisam sentir. Bebam água e tomem sol, se possível. Falta de vitamina D também mata. Façam vídeos pra aliviar as saudades, assistam lives (até enjoarem, porque eu já enjoei), durmam. Cuidem dos seus velhinhos, de perto ou à distância. Sobrevivam! Respirem! A gente precisa respirar, com tudo que isso significa.

   Vai passar.


Nana.