sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Série Uber - Seu Gustavo, o Infeliz

To bastante sumida, eu sei. Trabalhando como nunca, estressada como sempre e cada dia mais sem entender o que tá acontecendo com a minha vida. Normal, eu acho.

As pessoas que eu conheço andam bem exaustas ultimamente. De uma maneira geral tá todo mundo sobrecarregado e encostando nos cantos da vida, pedindo a Deus por sombra e água fresca.

A impressão que dá é que a gente tá em pé, num sol escaldante faz meses; sem água.

Mas não vim falar de tristeza e nem ficar me lamentando. Apesar de estar precisando desse momento "botar tudo pra fora", hoje não.

Eu hoje saí do trabalho bem tarde e vim pra casa de uber. Na verdade peguei carona com uma amiga no uber dela e, depois, pedi um pra chamar de meu. E eu não sei quem são vocês no Uber, mas eu sou a pessoa que fala, conversa, debate, discute, canta, assovia. Ri, chora junto. Pede e dá conselhos. Juro que faço tudo isso. E hoje, conversando com o Paulo Roberto, sobre as nossas vastas experiências nesse transporte maravilhoso - ele como motorista e eu como passageira - nos deparamos com a ideia de um livro sobre isso. Por que não?? E, como meu projeto de livro já é outro e anda BEM atrasado, resolvi trazer esse brilhante absurdo aqui, para meu espacinho. Abriremos, a partir de hoje, uma série de histórias divertidas, e outras nem tanto, sobre essas experiências que começamos a adquirir a pouco tempo, mas que já fazem muito parte da nossa rotina, não é mesmo?

Eu não sei se é do interesse de vocês ler sobre isso, mas eu gosto muito das histórias das pessoas. Sou apaixonada por compartilhar experiências. Sendo assim, vamos a Série Uber.

Pra começar, vou trazer de volta uma história que gosto demais  e que não aconteceu num Uber, e sim num táxi há muitos anos atrás. Espero que você, meu amado leitor, também consiga sentir, através das minhas palavras, a mesma coisa que eu senti naquela viagem e depois dela.

Isso aconteceu há dez anos atrás, em 2009....

Ontem foi um dia daqueles! Sabe aqueles dias que parece que tudo está predestinado a dar errado? Então. Ontem.
O tempo foi pouco pra fazer as milhares de coisas que eu tinha pra fazer e nem metade, dessas coisas, foram feitas. Ô dia!

 Estava no Sindicato (a toa, porque a funcionária não foi para a homologação) e pedi um táxi para voltar ao trabalho. Aqui na empresa a gente usa aqueles táxis de companhia que paga-se com voucher, sabe? O táxi demorou tanto...tanto...tanto... As portas do Sindicato foram fechadas, os funcionários foram saindo um a um e eu ali sentada na escada esperando meu táxi.

 Mais raiva, menos paciência. 

Depois de um bom tempo, bota tempo nisso, meu táxi chegou e eu conheci umas das pessoas mais interessantes que eu já tive oportunidade de conhecer na vida. Os poucos minutos que desfrutei de sua companhia, mudaram o meu final de dia.

 O taxista era um homem simples e me tratou cordialmente assim que entrei no táxi. Me pediu desculpas pelo atraso e justificou-se alegando que o trânsito estava engarrafado demais. "Muita chuva, muito carro, muito trânsito", disse ele. 
- Nunca vi Outubro desse jeito! O Sr. pode, por favor, diminuir o ar condicionado pois estou com muito frio- Pedi com a mesma cordialidade com que estava sendo tratada. 
- Frio!? quem sente frio é pobre! Frio e fome. Pobre é que sente essas coisas. - Não aguentei. Danei a rir. 
- Então sou muito pobre, porque estou sentindo muito as duas coisas! 

Começamos a conversa.
Ele elogiou meu nome. Disse que achava um nome muito bonito e que tinha uma amiga linda que se chamava Joana. Eu, com o mesmo discurso de sempre, disse que achava nome de velho! 

- Não, minha filha. Quer ver um nome de mulher feia!? Nunca vi mulher bonita nenhuma com esse nome: Rita! - ele quase soletrava. 

Ao longo do caminho eu soube que Rita foi uma mulher apaixonada por ele. Uma mulher, segundo ele, feia como a fome, feito um "toco de amarrar jegue", baixa, horrível. Rita fez de tudo pra ficar com ele e, numa noite infeliz, bêbado, ele foi fisgado pela Rita. Amanheceu na casa dela, com a mulher horrenda dormindo do seu lado. Como se não bastasse, Rita ficou grávida! 

- E quem disse que o filho era meu mesmo? Não acreditei e nem registrei! 
- Mas a criança não teve culpa! 
- Eu sei. Eduquei ele, ajudei na criação, mas levar meu nome não. Hoje ele é advogado, tem 34 anos.

 Quando soube que Rita estava grávida, ele ficou desesperado, pois amava uma mulher que também estava grávida dele. Sônia. Ele tinha planos de construir uma vida a dois com Sônia. Fez planos de casar e ter um cantinho pros três: ele, Sônia e o bebê. Três dias depois de tudo certo, Sônia sumiu. Foi embora do Rio de Janeiro para a casa dos seus pais no Espírito Santo sem avisar nada à ninguém. 

- E o Sr., o que fez? 
- Eu fui atrás dela! 

Pegou suas poucas economias e foi ao Espírito Santo atrás da mulher amada. Não tinha seu endereço, telefone, absolutamente nada. Seguiu apenas com algumas coisas que ela havia dito para ele sobre a casa de seus pais, enquanto estavam juntos.
- E o Sr. achou ela? 
- Claro que achei! 

Ficou 15 dias na casa dos pais dela. Voltou ao Rio de Janeiro para preparar as coisas para buscar ela de volta. Quanto retornou ao Espírito Santo, alguns meses depois, Sônia havia ido embora de novo...
- De novo? 
- De novo! 
- E o Sr., o que fez? 
- Fui atrás dela de novo! 

Eu quase não acreditei, mas estava gostando muito da história! Encontrou Sônia de novo, mas dessa vez deram um fim na relação. 

- Ela era inconstante demais! 
- E o Sr, se casou? 
- Casei com uma mulher que eu nunca gostei! sempre odiei aquela mulher! 

Casou por pressão da família. Praticamente obrigaram ele a casar. Tentou adiar a cerimonia para tentar que esquecessem, mas ninguém esqueceu e ele se casou com ela. 

- E durou quanto tempo? 
- Dura até hoje! A gente não se suporta, mas não separo só de birra! Não me obrigaram a casar? Agora obrigo a permanecer casada. 

 Fez-se um longo silêncio no táxi e eu já estava quase chegando ao meu destino. Ri tanto durante todo o caminho e agora nada daquilo fazia muito sentido. 

A pergunta estava engasgada na minha garganta e eu a fiz. 

- O Sr. é feliz? 
- Não, minha filha. Sô não! Nunca fui. 
- Mas ela também não é feliz? 
- Não. Nem ela e nem eu. Uma pena, né? 
- Uma pena... 

Triste demais. 
Histórias alegres de um homem triste. História triste de um homem alegre, mas não feliz. 

Seu Gustavo. Taxista. 

Um senhor com, sabe Deus, quantos filhos e uma vida inteira para trás! Quilômetros dela, já percorridos. 

Estávamos em frente ao local onde eu iria descer. Estava atrasada, cansada, mas a raiva não estava mais ali. Não poderia estar! Agradeci a viagem e contei ao Seu Gustavo que pediria a Deus para que ele fosse feliz! 
Ele pegou mais um passageiro, um Senhor de terno e gravata que entrou assim que eu saí. Perguntei-me se aquele, talvez, era feliz... Jamais vou saber.

Eu não sei como concluir esse texto. Pensei tanta coisa sobre Seu Gustavo, Rita, Sônia e a esposa infeliz, e cheguei a tantas ocas conclusões que esse texto não terminaria se eu as escrevesse.

Eu só tenho certeza de uma coisa: A vida da gente passa... rápido como uma viagem de táxi!

 Nana