terça-feira, 15 de julho de 2014

O pai - série biografia

O mês de Julho é um mês muito especial pra mim, e ao mesmo tempo um mês triste. Em julho faz frio, em julho estamos no meio, em julho meu paizinho fazia aniversário. 

E é em homenagem a ele que eu gostaria de fazer esse post biográfico. Queria contar um pouco das muitas e boas histórias que tivemos. Desde que meu pai se foi não consigo escrever sobre ele. Já tentei algumas vezes mas sempre existe um bloqueio, uma saudade tão absurda que apago tudo e não  quero lembrar, mas hoje eu quero. É julho! 

Meu pai nunca foi um pai muito convencional. Hippie, muito doido, muito engraçado. 

Eu não lembro, mas ele contava que uma vez eu tinha uns 3 anos e eu fui tirar sangue. Pra não chorar ele dizia que estava saindo coca-cola do meu braço. Eu quis beber a coca-cola do braço e ele teve que comprar um lanche pra nós dois. Meu pai tinha o estômago muito fraco pra frituras. Passou mal e, como só estávamos nós dois, ele teve que me levar no banheiro junto. Ele contava que minha cara ia piorando e eu falava: "ta fedendo papai! A coca-cola ta saindo agora de você?" Se ele tivesse celular provavelmente teria registrado minhas caretas! 

Meu pai tinha brincadeiras muito brutas. Pra nos "fazer crescer" ele nos pegava pelas orelhas e levantaaaaava bem alto! Pra fazer suco de tomate ele espremia a gente na parede e gritava SUCO!!!!! Pra fazer carinho antes vinha um tapa e pra beijar antes tinha que puxar pelo pescoço. Ahh ele gritava apertando: pescociiiiiinho! 

Quando íamos ao parque de diversões era sempre traumático! No trem fantasma podia ter ladrão e estuprador. Naquele escorrega gigante podia ter navalha no meio e cortar nossas pernas, na piscina de bolas cobra, no pula pula podíamos ser pisoteados. Mas nos outros podíamos ir mil e quinhentas vezes! 

Desde que me entendo por gente íamos pra Itaipuaçu pra casa dos meus avós. (Itaipuaçu merece um post a parte) Mas uma vez estávamos na casa da vó Gilda e ele passou pra nos buscar pra passar o fim de semana com ele. Não quisemos ir, pois nossos amigos estavam todos lá. "Não seja por isso, vamos levar seus amigos!" Ele foi de casa em casa pedindo aos pais. Resultado: 14 crianças viajando numa Brasília marrom! Não me perguntem como coube, mas coube! Pra matar a fome daquele povo todo, parou na padaria e comprou baguetes e coca de dois litros! Copo? Faca? Tudo na mão e bebendo no gargalo mesmo! Uma sujeira, uma zona, uma felicidade....

 Uma vez fomos fazer uma trilha de bicicleta e andamos muito! Pra quem conhece Itaipuaçu andamos do Recanto até a Rua 1! Eu com aquela ceci rosinha, ele com a bicicleta dele, a do meu irmão nas costas e com Davi na garupa! Já tínhamos ido, estávamos voltando. Ele gritava: força minha guerreira! Estamos chegando! Força guerreirinha! 

E era assim que ele me chamava. Até seu último dia foi assim, "minha guerreirinha"! 

Todas as vezes que eu tô muito triste, todas as vezes que eu acho que não vou aguentar mais, sempre que acho que não sou forte o bastante, eu lembro que sou a guerreirinha dele! E vou ser pra sempre! 

Nana 

terça-feira, 1 de julho de 2014

O anel - série biografia

Eu tinha uns 8, 9 anos e estudava numa escola católica em Brás de Pina.

Na minha sala, um menino (não lembro o nome dele, juro) se disse apaixonado por mim. Não, ele não era bonito. E mesmo se fosse, que tipo de criança vocês pensam que eu fui??? rs
Ele se declarava todos os dias. Chato. Insistente! Mandava os amigos me dizerem que ele me amava, pra eu ter pena e compaixão por ele e dar uma chance. Eu não era dessas que dava chances. Eu não era dessas que me compadecia porque os amigos tentavam me convencer. Eu era bem nojenta. 

Aquilo começou a me irritar, me irritar muito, mas nada adiantava. 

Um dia ele chegou na aula, fez mais uma vez aquela cena, mas dessa vez foi diferente. Ele tirou do bolso um anel, um anel com a cara da Minnie de laço vermelho na cabeça. Uma graça. Fiquei tentada a negar o anel, mas achei que seria mal educado. Aceitei e disse que nada mudava entre nós, mas agradeci e disse que achei fofa a iniciativa. Achei mesmo. 

Achei tão fofo e me senti tão importante que mostrei o anel pra escola inteira! Mostrei pras amigas e pra quem não era amiga também! 

"Que mulher não gosta de ganhar joias"??? Com oito anos qualquer anel é joia! 

Na porta da escola tinham várias pessoas vendendo várias coisas. Sorvete de casquinha, pirulito de chupeta, laranjinha (nunca mais vi venderem laranjinha)... Um mundo de coisas bem na porta da escola.
E tinha uma "tia" que vendia bugigangas. Fones de ouvido, canetas, adesivos, enfim, milhões de coisas! 

No meio da aula, no mesmo dia que ganhei o anel, a tia entrou alucinada pela sala com a coordenadora, que pediu licença a professora para interromper a aula. Ela entrou, procurou e apontou:

- Foi ele! Foi aquele garoto ali! 

Eu acho que não preciso dizer que ela apontou pro garoto que me amava. A coordenadora pediu que ele a acompanhasse imediatamente. Ficamos todos apreensivos na sala de aula. A professora tentando controlar a curiosidade da turma. Quando a coordenadora entrou novamente na sala:

- Professora, a Joanna pode me acompanhar? 

Pronto. Gelei. Congelei. Até chegar na porta da sala parecia que o espaço não  terminava. O que eu tinha a ver com aquilo? 

Com todo o tato a coordenadora perguntou se por acaso ele nao havia me dado um presente. Eu disse que sim. Com mais tato ainda ela me questionou se tinha sido um anel. Eu olhei pra ele. Tenho certeza que ele sentiu meu ódio! O olhar dele clamava pra que eu negasse. Eu queria negar e depois arrebentar ele, mas não podia. Eu disse que sim. Ela pediu gentilmente que eu devolvesse o anel porque infelizmente ele não tinha pago por ele. 

Eu senti meu rosto pegar fogo. Minha vontade era pegar aquele anel e enfiar goela abaixo dele. Eu sei que parece meio cheio de ódio e rancor esse post, mas a vergonha daquele momento só me fazia sentir isso. Eu tirei aquele anel com tantos sentimentos juntos... Devolvi pra moça e perguntei se já podia entrar na sala. Ela disse que sim e agradeceu. 

Entrei e chorei. Fiquei com pena dele. Dei meia volta e chamei a coordenadora num canto. Pedi que nao punisse ele, porque ele fez aquilo pra me agradar, que foi sem querer. Ela pediu que eu não me preocupasse e que eu voltasse pra sala.

Ele não foi suspenso. Nada aconteceu. Acho que só ligaram pros pais dele. Depois desse dia nunca mais nos falamos, exceto pelo momento em que ele me pediu desculpas e eu disse que "tudo bem". 

Depois desse dia nunca mais ganhei anel nenhum. E o único que ganhei não pude guardar de recordação! 

Nana